Teu melhor e teu pior em 2024
De Adelaide Ivánova a Vanessa Barbara, passando por JP Cuenca e Camila von Holdefer, pedi aos amigos substackers suas piores e melhores leituras neste ano
#pilhadeleiturasperdidas
Se o Substack é a nova blogosfera, na edição Best of 2024 da Invenções de Morel resolvi acionar meu blogroll. Antigamente, coisa de vinte anos, você colocava um blogroll do lado direito ou esquerdo do texto principal, onde iam teus posts. Ali estavam os blogs de amigos & favoritos. E ia se formando um clima terrível pulando de blog em blog, às vezes caindo em endereços bem aleatórios. Ah, a internet moleque! Era quando se praticava a verdadeira arte do encontro à Ronaldinho Gaúcho, sem precisar de um algoritmo algoz de sua liberdade.
Guiando minhas obsessões, cada vez mais tenho usado a página inicial do Substack pra acionar novas páginas favoritas. Algumas estão há uma cota no meu personal blogroll, como Vanessa Barbara, Arnaldo Branco e JP Cuenca. Outros são velhos companheiros de guerra no jornalismo; algumas frequentam minhas retinas de anos para cá e já colaboraram na Morel, como Adelaide Ivánova, Aline Valek e Gaía Passarelli; outras conheci via Substack, como Beatriz Veloso, Gabrielle Estevans e Olivia Merquior. Tudo pra fugir do escrutínio do tio Zucker, curando o vício consumista pautado pelo scroll infinito de feeds e reels e stories.
É refrescante e inspirador praticar a leitura ativa flanando pelas newsletters dos amigos. Assim, divido com vocês um pouco da minha louca leitura semanal. Não estão aqui todos os que leio – muitos não tiveram tempo de responder, outros ainda não convidei (ficam pras próximas, quero fazer isso sempre). Pra não ficar refém do mercado editorial, pedi a Melhor e a Pior leitura de 2024, porém não necessariamente livros publicados neste ano. Tem coisas surpreendentes...
Adelaide Ivánova, poeta e autora da Vodca Barata
MELHOR
Patrícia Galvão: Pagu, Militante Irredutível. Finalmente um livro sobre a camarada que não apaga sua luta político-partidária nem a trata como algo secundário, como “deslize” ou “ponto baixo” na biografia (coisa que tantas vezes aconteceu). Pagu era uma poeta comunista, militante filiada em partido, organizadora comunitária e foi muito mais que uma ativista “pelos direitos da mulher”, posição à qual tantas vezes editores, curadores e feministas liberais a reduzem. Sem contar seu extraordinário trabalho com poesia, romance, jornalismo. Por fim, o emocionante depoimento da também camarada Maria Valéria Rezende, colhido por Joselia Aguiar, coloca a ideologia de ambas (Pagu e Maria Valéria) como ponto de partida ou de chegada de tudo que fizeram. Demorou.
PIOR
A cobertura da mídia liberal sobre a guerra de Israel contra a Palestina. Da Folha de São Paulo ao NY Times, passando pelo detestável Die Welt, não se salva um com a decência de dar às coisas o nome que elas têm e fazer jornalismo que seja digno do nome.
Aline Valek, narradora, artista visual e autora da Uma Palavra
MELHOR
Me marcou em 2024 Ao Farol, de Virginia Woolf (trad. Tomaz Tadeu). Primeiro, pela expectativa que ela consegue sustentar o livro inteiro. Será que o clima finalmente vai firmar para irmos ao tal do farol ou não? Segundo, ela me dá uma invertida e mostra que o importante não é o destino final, mas a travessia dentro de cada personagem. Incrível como um romance de quase um século até hoje soa tão fresco e inventivo, em um texto cravejado de diamantes. Ler Virginia é combustível, me enche de vontade de escrever.
PIOR
Achei tão ruim que não passei da página 75: Belo Mundo, Onde Você Está, da Sally Rooney (trad. Débora Landsberg). O problema foi meu, todo meu, de esperar algo mais elevado de uma autora tão aclamada pela mídia, e encontrar uma linguagem cafona e personagens chatérrimos. Me senti enganada. A protagonista escritora de classe média e suas questões amorosas só me deram preguiça. Talvez devesse dar uma chance e terminá-lo? Ou talvez Sally Rooney não seja mesmo meu tipo de literatura. Acontece.
Arnaldo Branco, roteirista e autor da Semana Praticamente Encerrada
MELHOR
Os Supridores, José Falero. Nem sei dizer se foi mesmo a melhor leitura porque me levou a outros livros do Falero e todos são páreo duro. Um empregado da reposição de estoque em um supermercado resolve reproduzir o comunismo em pequena escala traficando maconha. Não só é um livro excelente como está destinado a ser um filmaço se os caras que compraram os direitos fizerem o mínimo de esforço.
PIOR
O Ano Em Que Disse Sim, Shonda Rhimes. Não sei se conta como leitura porque ouvi em audiobook enquanto passeava com os cachorros. Alguém me disse que era um livro de autoajuda diferente e acreditei porque sou fã das séries que escreve, mas é meio que mais do mesmo disfarçado de autobiografia, provando que se você não tem uma vida interessante não adianta ter talento ficcional (cof cof Karl Ove Knausgård).
Beatriz Veloso, antropóloga e autora de Beatriz Veloso
MELHOR
O livro mais marcante foi Flâneuse, da nova-iorquina Lauren Elkin (Fósforo). O título, feminino do substantivo flâneur, aponta o percurso que a autora nos convida a explorar: mulheres que andam por Paris, NY, Tóquio, Veneza e Londres. Refletindo sobre a importância do caminhar para artistas como Virginia Woolf e Sophie Calle, a autora descreve em pormenores o bairro em que vivia em Paris – uma das coincidências que compartilhamos –, e tive a sensação de ler na rua o que eu andava no texto. Mais que um ato cotidiano, caminhar se revelou um gesto político para mim, ressignificando algo que aprendi desde os primeiros anos de vida. A cereja do bolo? A FLIP deste ano, que homenageou o criador da flaneuserie no Rio de Janeiro: João do Rio.
PIOR
A mais difícil de concluir: O Direito ao Sexo, da filósofa barenesa Amia Srinivasan (Todavia). O livro é excelente e muito político, assim como o primeiro, porém aborda temas como o suposto direito ao sexo que incels reinvidicam em seu benefício, a cultura pornográfica e também a de estupro em toda sua complexidade. Livraço, mas não para ler em jejum.
Camila von Holdefer, pesquisadora e autora da Jaguatirica de Coleira
MELHOR
Vou ficar com As Planícies, livro finório do australiano Gerald Murnane (Todavia, excelente trad. de Caetano Galindo). Livro esquisitíssimo, como o Bressane já disse, As Planícies faz uma espécie de etnografia do povo das planícies. No livro, o espaço molda as características que a arte e a cultura adquirem, mas isso de uma forma bem explícita. O que é comum ao povo das planícies? As planícies. E a obsessão pelas planícies. Tudo que envolve o lugar — a história do lugar, as disputas do lugar, a estética do lugar, o clima do lugar, a paisagem do lugar, os animais do lugar — os moldou e ainda os ocupa. Diariamente. Profundamente. Existencialmente. Mas isso também se contradiz:
Ouvindo os homens das planícies, fiquei com a desconcertante sensação de que eles não desejavam contar com um conjunto de crenças comuns: parecia que cada um ficava incomodado se tivesse a impressão de que um outro dava como certo algo que ele afirmava a respeito das planícies como um todo. Era como se cada homem dali escolhesse parecer um habitante solitário de uma região que só ele sabia explicar. E quando falava de suas planícies particulares, parecia escolher as palavras como se a mais simples delas não visse de um vocabulário qualquer mas derivasse seu sentido apenas do uso idiossincrático que ele fazia dela.
Belíssimo, estranhíssimo livro.
PIOR
Meu prêmio Chinalation of Chinelagem 2024 é Pragmatism: Philosophy of Imperialism, um livro publicado em 1954 e escrito por um sujeito chamado Harry K. Wells, já falecido. O senhor Wells pertence àquele grupo que diz que o pragmatismo nega a realidade e a verdade objetivas e que é a filosofia dos que reconhecem e validam apenas o sucesso individual. Sim, sim, vovô, vamos levar você para a cama. Mas aí o senhor Wells vai mais longe e diz que isso faz com que o pragmatismo NÃO SEJA LEGITIMAMENTE MARXISTA, o que ninguém jamais ousou dizer que era. E aí temos duzentas páginas do senhor Wells conversando com as vozes da cabeça dele. Bem, o meu exemplar já está com as páginas amareladas e todo descosturado e, visto que não está naqueles sites russos de downloads, não é muito lido. Mas vale o prêmio. Se alguém quiser ir atrás dessa belezinha, a editora é a Lawrence & Wishart.
David França Mendes, escritor, roteirista e autor da Ein Filterkaffe
PIOR/MELHOR
Quando não gosto do livro eu largo, e em geral largo cedo. Até que aguentei bastante Klara e o Sol, do Kazuo Ishiguro. Mais do que deveria, devia ter zunido longe e logo aquele papo chato de androides tristinhos. Aturo alegoria quando vem com algo mais que uma moral da história. Bem o contrário do Agora Agora, do Carlos Eduardo Pereira, minha leitura do ano. O romance do Carlos não é alegoria, é pancada mesmo. A cada capítulo, sem fazer estardalhaço e nem sublinhar intenções, Carlos vai avançando na história dos seus três Jorges e fazendo um retrato concreto dos efeitos do racismo estrutural brasileiro. Destaco o capítulo 39, o da Catirina, que você pode ler como se fosse um conto, e que dá uma ótima ideia da qualidade do livro.
Eric Novello, escritor, roteirista de games e autor da Encruza
MELHOR
Tese Sobre uma Domesticação, de Camila Sosa Villada. A família tradicional de comercial de margarina ganha seu contraponto queer e subversivo. Uma travesti egoísta e sem pudores que é uma das atrizes mais famosas da Argentina se casa com um advogado rico e bem-sucedido que, por acaso, é gay. Para completar a família, eles adotam um menino soropositivo. Enquanto nos mostra o passado e presente da atriz, sua relação com os pais, casos do relacionamento aberto, marido, filho e amigas, Camila Sosa Villada reflete sobre até que ponto perseguir ideais de sucesso criados por uma sociedade normativa é (ou não) se deixar ser domesticado. Me agrada particularmente ver personagens LGBT+ representados sem nenhum verniz de higienismo e perfeição.
PIOR
The Hellbound Heart / Hellraiser, de Clive Barker. Lançado em 1986, apresentou sua criação mais famosa: os cenobitas. Quem é fã de horror já esbarrou por aí com o Pinhead (ou Hell Priest). Mas muito da construção icônica a partir do primeiro filme está apenas pincelada na obra original. Em vez do horror profundo, o componente de maior peso no livro é um romance um tanto cafona que me pareceu aquém da maioria das histórias contidas nos Livros de Sangue e em trabalhos de menor fama. Vale mais pela pesquisa que pela diversão.
Érico Assis, tradutor e crítico de quadrinhos, autor do Virapágina
MELHOR
Ronson, César Sebastián (Autsaider Cómics). Este quadrinho não me convence pela descrição: conta a vida e as histórias de um vilarejo no interior da Espanha dos anos 1960. Também não é mirabolante ou inovador na exploração formal; o único detalhe gráfico é que, além do preto e branco, usa um tom de dourado. O jeito como o autor faz a mescla entre o que é memória, o que é ficção – e como isso fica ampliado por um desenho que tenta investigar o que é fato, mas sempre vai transformar em ficção – é o que dá uma alma a Ronson diferente de tudo que eu já li. E muda o que você pensa sobre suas próprias memórias.
PIOR
O Ato Criativo, Rick Rubin (Sextante, trad. Beatriz Medina). Tenho atração por livros sobre criatividade e processo criativo, e este do produtor musical Rick Rubin me foi recomendado por gente em quem eu confio. Só que não bateu. Estratosférico, aleatório, disperso, terminei pensando que as recomendações se resumem a “tudo vale a pena e boa sorte aí, valeu?”. Para compensar essa leitura, Arte e Medo, de David Bayles e Ted Orland, foi um bom remédio: os autores têm os quatro pés no chão.
Gabrielle Estevans, psicanalista e autora da Casa
MELHOR
Num ano em que o mundo parecia desmoronar lá fora, as leituras foram boias de braço; se não ensinando a nadar, pelo menos evitando o afogamento. No topo das preferidas, Hospício é Deus, de Maura Lopes Cançado. Cheguei até Cançado por conta de minha pesquisa de mestrado em Psychanalyse et Interdisciplinarité, na Université Paris Cité, onde investigo a palavra da mulher como transgressão, especialmente frente à leitura patriarcal da loucura. São 288 páginas de um relato visceral da infância às internações psiquiátricas, revelando uma literatura que desafia, de peito aberto, o controle sobre determinadas vidas e certos corpos.
PIOR
Já na zona de rebaixamento da lista, Ioga, de Emmanuel Carrère. Ficou empilhado meses até que, depois de vê-lo indicado por Karl Ove Knausgard, autor de uma das sagas que mais admiro, resolvi dar uma chance. Foi doloroso. Muitas pausas em uma leitura que não engatava. Alguma coisa parecia desencaixada naquela escrita, apesar do hype. Talvez, para mim, o problema tenha sido o excesso de introspecção autocentrada: mais um homem esquadrinhando suas crises existenciais, enquanto não deixa de pesar a mão nas autocitações.
Gaía Passarelli, jornalista, cronista e autora da Tá Todo Mundo Tentando
MELHOR
Babel, da RF Kuang. É da mesma autora de Yellowface, que ganhou tradução em pt-br esse ano [Impostora], mas vai para um lugar totalmente diferente, fantástico e surpreendente. Kuang cria um mundo paralelo em que a Inglaterra exerce seu poderia econômico por meio de barras de prata que têm funções que vão de aquecer água a proteger edifícios. Como as tais barras mágicas são ativadas através da tradução de palavras, o coração do império inglês é a universidade de idiomas de Oxford, mais precisamente os alunos estrangeiros de uma torre chamada Babel, onde se desenrola quase toda a trama. É um livro sobre muitas coisas, incluindo a tragédia do colonialismo e questões e raça e gênero na academia, mas é na essência um livro sobre linguagem, mais exatamente sobre as impossibilidades da tradução exata. Se puder leia no original (em inglês).
PIOR
Annie Ernaux. Pedindo desculpa aos muitos fãs da Nobel francesa, mas... não me pega. Entendo que como obra tem muita consistência e que toque em temas importantes como aborto. Mas falta charme e sobra umbigo e já temos demais disso por aí. Também pode ser que eu mesma não aguente mais a editoria “mulher escrevendo sobre ser mulher”, ainda mais quando é uma recomendação tão correta e segura. Falta veneno. Aproveito a oportunidade para recomendar a Virginie Despentes, também francesa, rebelde e atualíssima.
Isabelle Moreira Lima, jornalista, foodie e autora de Saca Essa Rolha
MELHOR
Tenho entendido que a literatura é boa amiga da psicanálise; as duas fazem um belo trabalho em conjunto. Nessa pegada, Afetos Ferozes foi um dos grandes livros do ano. Apesar de ter sido publicado em 1987, se mantém atual. Afinal, mudam as relações entre mãe e filha? Importa também o contexto e a geografia? Se limpamos o cenário e a “direção de arte”, sobram pessoas e eu tenho lá minhas dúvidas se somos tão diferentes assim. Consegui me ver e ver minha mãe e, quem sabe (espero que não, mas é a vida), eu no futuro também. Junto a A Filha Perdida, de Elena Ferrante, que li em 2020, e De Quatro, de Miranda July, que ainda estou terminando, forma uma boa trilogia para minha versão de 40 anos.
PIOR
Não sou populista preocupada em desagradar, sou uma abandonadora. O tempo é curto para tanta coisa a fazer, ver, comer, ouvir, beber, cuidar, que, se eu não gosto, abandono. Fica aqui o conselho então para quem está nos lendo: não gostou? Não perca tempo!
JP Cuenca, romancista e cineasta, autor de JP Cuenca
MELHOR
Em 2024 praticamente não li literatura de ficção. Estou mergulhado em grimórios, manuais e livros iniciáticos de ocultismo, estudando paradigmas, em especial o que recentemente decidiram chamar de Magia do Caos. Me interessa pensar arte, ciência e religião desde um ponto de fuga, um momento em que essas práticas ainda não tinham esses nomes. Tenho a impressão de que logo deixarão de ter novamente. O melhor que li esse ano estou lendo e relendo e sonhando desde que pus as mãos nele: Arte e Magia do Caos: Obra Reunida, do Austin Osman Spare. É uma edição absurda da Palimpestus, tocada pelo grande escritor, tradutor e editor Rogério Bettoni. O livro está esgotadíssimo e será reeditado em breve, mas você pode seguir a Palimpsestus e comprar as edições maravilhosas do Alan Chapman, Phil Hine e Pamela C. Smith. É tudo finíssimo. A Palimpsestus abriu um crowdfunding para novas edições do
Aleister Crowley, organizadas e anotadas pelo Chapman; imperdível. Dele, esse ano botei as mãos em edições antigas, em especial em Diary of a Drug Fiend and Other Works, da Sirius Publishing. Também mergulhei numa caixa maravilhosa da
Blavatsky, publicada pela Ajna Editora e numa edição dupla e linda da Penumbra Livros de Liber Null e Psiconauta, do Peter Carroll.
PIOR
Tenho largado antes da segunda página o que não faz a cabeça, o que me fez ficar bem longe de boa parte dos queridinhos do ano. Tão longe que pareço viver noutra galáxia. Não é uma sensação ruim. Como dizem: “Love is the law. Love under will”.
Olivia Merquior, consultora de moda, autora d’O Sistema da Moda
MELHOR
Sou daquelas que lê vários livros ao mesmo tempo e cada um no seu tempo. Dos que estão terminados, adorei High Hitler, do Norman Ohler. Uma investigação histórico-jornalística sobre a indústria das drogas (legais e ilegais) e o nazismo. Muito bem escrito e apurado. Outro que me surpreendeu foi Vestido em Chamas, do Ocimar Versolato. Não dava nada e terminei as 200 páginas em horas. Não é um Nobel literário, mas uma história esquecida que fala sobre as aspirações e desejos que o sistema de moda irradia em países como o Brasil. Dos mais midiáticos, Animal e Três Mulheres da Lisa Taddeo me fisgaram. Fora isso, terminei no sábado A Nostalgia, da Barbara Cassin, e quase gostei de tudo; derrapou no último capítulo, mas é filologia – muito nichado. Pra terminar a lista entediante com chave de ouro: Da Contracultura à Cibercultura, do Fred Turner, me fez entender muito do mundo de hoje ao contar a história da construção do Vale do Silício através do LSD.
PIOR
Tenho ótima memória seletiva, então os piores são rapidamente encaminhados para a área Dory do meu cérebro.
Pérola Mathias, jornalista e pesquisadora musical, autora de Poro Aberto
MELHOR
Vale O Que Tá Escrito, Dan (DBA) e O Embranquecimento, Evandro Cruz Silva (Patuá). Estilos muito diferentes, mas ambos tratam de temas que permeiam a história do Brasil de forma original, assertiva e trazendo à tona tensões nas vivências de personagens super bem construídos. A literatura contemporânea é bem sucedida quando não faz do seu espaço algo panfletário mas se mostra consciente das diferenças.
PIOR
Pra desafinar o coro dos contentes, confesso que não gostei de Como se Fossem as Sílabas do Sábado, de Mariana Salomão Carrara (Todavia). Acho a personagem chata, os insights dela, como o tal homem orquídea, cafonas, e a prosa se repete muito. Um dos raros livros que abandonei, mas pulei até o final pra ver o que ia acontecer e pensei “ah, ok”.
Peu Araújo, jornalista e escritor, autor de Jovem Há Muito Tempo
MELHOR
Quase Verão, livro de contos do jornalista Renan Marinho Sukevicius, que tem uma vivência periférica e traz um olhar poético para uma realidade dura, especificamente para aquela galera que tem que pegar a Belmira Marin para sair do Grajaú.
PIOR
Talvez seja heresia, pois é um livro que comecei duas vezes e ainda não me pegou, mas planejo dar uma terceira chance a ele e me amargar profundamente por estar escrevendo essas linhas tortas sobre O Vendido, do Paul Beatty. Comecei a ler num voo, depois em outro momento de passagem e ainda não me conectei. Se mudar de ideia, peço direito de resposta a mim mesmo e volto aqui...
Thales de Menezes, jornalista cultural, autor da Torpedo
MELHOR
Li muitos autores japoneses na temporada. E o mais bacana dessa turma é Tédio Terminal, de Izumi Suzuki, atriz e modelo que se tornou uma grande autora de ficção científica e ensaios de cultura pop. Foi musa do lendário fotógrafo de pin-ups Araki e se suicidou em 1986, aos 36 anos. Esse livro de contos dos anos 1980, no Brasil pela DBA, fala de governos totalitários, transição de gênero, calamidades climáticas e tecnologia invadindo a vida das pessoas. Parece ter sido escrito ontem. E muito bem escrito.
PIOR
Gravidade Zero, coletânea da Nova Fronteira com textos de Woody Allen para a revista The New Yorker e alguns inéditos, foi uma enorme decepção. Tem uma tradução esquisita, repleta de vocábulos nada coloquiais. Difícil de ler, não parece nada com a prosa fluida de Allen. Comparado ao original, houve a opção por uma narrativa mais formal. Um resultado ruim, principalmente ao lado das traduções magistrais e coloquiais que Ruy Castro fez para livros de Allen nos anos 1970, como Cuca Fundida e Que Loucura!.
Thiago Ney, jornalista cultural, autor da MargeM
MELHOR
Poderia ter escolhido Intermezzo como a melhor leitura do ano, porque a história de dois irmãos que perderam o pai e tentam se equilibrar entre relacionamentos que parecem não ter futuro é muito bem desenrolada pela Sally Rooney, talvez em seu melhor livro. Mas não dá para não apontar Impostora, da R. F. Kuang, em que humor e tensão carregam uma história que envolve temas nada fáceis (apropriação cultural; plágio; a dinâmica das redes sociais).
PIOR
Aquela de todas as manhãs, quando abro o Twitter.
Vanessa Barbara, escritora, tradutora e jornalista, autora d’A Hortaliça
MELHOR
Nickel and Dimed: On (Not) Getting By in America, de Barbara Ehrenreich (2001). Neste clássico publicado mais de vinte anos atrás, a jornalista norte-americana exerce trabalhos mal remunerados por três meses em cidades diferentes: garçonete, faxineira e funcionária do Wal-Mart. Ela tenta sobreviver desses empregos. Spoiler: não consegue. Não sei explicar por que ainda não tinha ouvido falar desse livro, mas, assim que comecei, indiquei para todas as pessoas que encontrava e, logo que terminei, decidi ler de novo. “Os ‘trabalhadores pobres’ são de fato os maiores filantropos da nossa sociedade. Eles negligenciam seus próprios filhos para que os filhos dos outros sejam cuidados; eles vivem em moradias precárias para que outras casas sejam brilhantes e perfeitas; eles suportam a privação para que a inflação seja baixa e os preços das ações sejam altos. Ser um trabalhador pobre é ser um doador anônimo, um benfeitor sem nome, para todos”.
PIOR
Sobre Desistir, de Adam Philips (2024). Não digo que foi o pior livro que li este ano, mas foi o único que me fez desistir depois de ler o prólogo. Talvez isso fale mais sobre a eficácia da mensagem do livro do que seu conteúdo. Em todo caso, as resenhas são interessantes: “Desistir é a tentativa de criar um futuro diferente”, ele diz. Talvez eu retome a leitura no ano que vem.
Gracias pela leitura!
Abraços,
Ronaldo Bressane